
Factos:
- o petróleo está caro e tudo indica que vai continuar a subir, quiçá até vai faltar;
- o uso do petróleo e seus derivados polui o planeta.
Posto isto, é recomendável encontrar soluções sustentáveis (não só quanto ao ambiente, mas também no funcionamento da economia e na coesão social) para os problemas nascidos da agitação dos mercados da energia. Optar por "remendos" não leva a grande futuro.
Num funcionamento saudável dos mercados com concorrência real (qualquer que seja o produto ou serviço), há alguma proporcionalidade entre os custos de produção/distribuição, e os preços de venda ao consumidor final. Ou seja, se os primeiros aumentam, os últimos também reflectirão essa alteração. Com esta alta do petróleo, quase tudo vai ter que aumentar. Por isso estranho a posição dos agentes económicos ao queixarem-se de que não conseguem absorver internamente o incremento dos custos, pois a situação normal seria aumentarem também o preço de venda para manterem margens razoáveis de lucro. É evidente que o consumo assim poderá diminuir, mas essa é outra questão. Já lá vamos.
Há efeitos secundários positivos do petróleo caro, até: a deslocação da produção para energias renováveis, não poluentes, e a racionalização do seu uso (maior recurso a transportes públicos, melhor planeamento urbanístico, procura de habitação mais próxima do local de trabalho, etc.). Ou seja: se o consumidor não estivesse "mal de massas", esta crise não seria especialmente grave.
Em Portugal há contudo dois problemas específicos:
- os combustíveis estão demasiado sobrecarregados com impostos, o que prejudica a economia (de forma mais vincada quando directamente em competição internacional);
- a população tem pouco poder de compra, pelo que sente com agravada intensidade qualquer aumento do custo de vida.
Qual é então a via sustentável a seguir?
- nivelar o peso dos impostos dos combustíveis pela norma europeia, para que a actividade económica nacional tenha um contexto mais próximo do europeu;
- liberalizar efectivamente o mercado dos combustíveis;
- deixar que os preços junto do consumidor final aumentem (não só dos combustíveis, entenda-se, mas de tudo o que for afectado por eles);
- o Estado, cumprindo a sua função social, apoiar as pessoas (não as empresas!) que sofram carências graves nesta nossa economia em dificuldade.
O PSD, a meu ver, não deve defender soluções complexas (porque não se conseguem gerir convenientemente), nem muito diferentes das que são correntes no resto da Europa. A função do Estado não é defender as empresas, mas sim as pessoas; o apoio às empresas pode fazer sentido, mas na estrita medida em que isso defenda os cidadãos. Por isso, o que as empresas têm que fazer é realmente aumentar os preços que praticam aos seus clientes, em condições semelhantes às suas concorrentes no estrangeiro - se forem boas sobrevivem, senão terminam. Não haverá uma redução dramática do consumo se o Estado apoiar directamente os cidadãos mais frágeis, em vez de usar métodos indirectos que são "cegos" e beneficiam indistintamente quem precisa e quem não precisa.
Este blog é um bom sítio para trocar ideias sobre este assunto. Afinal onde melhor do que nos partidos se deve fazer o debate das políticas? É por isso que Pedro Passos Coelho faz diferença. ;-)
De
TAF a 23 de Maio de 2008 às 03:25
Surgiu há pouco aqui um comentário que eu apaguei porque não cumpria normas mínimas de civismo. Referia contudo um assunto a que respondo agora, sobre centrais nucleares: eu não concordo com a sua construção em Portugal. Pelo menos nos próximos anos. É daquelas decisões que só deve ser tomada se não houver nenhuma alternativa ou, havendo, se o respectivo custo fosse absolutamente incomportável.
O risco, por pequeno que seja, não compensa. Além disso há problemas de armazenamento de resíduos para os quais não se encontrou ainda uma solução boa. Eu tentaria todas as alternativas e talvez com alguma sorte se consiga aguentar sem as actuais centrais de fissão até que um dia (daqui a várias dezenas de anos) esteja em produção a tecnologia de fusão nuclear, essa sim limpa e sem riscos.
De MP a 23 de Maio de 2008 às 13:18
Caro TAF;
O crude, infelizmente, não vai acabar tão cedo. As reservas, naturais e 'artificiais', são imensas.
A teoria peregrina da escassez de 'crude' apenas surgiu para permitir a especulação.
De
TAF a 23 de Maio de 2008 às 13:59
Certo. Mas repare que eu escrevi "vai faltar". O facto de existirem reservas não significa que os produtores as disponibilizem ao mercado, como aliás se tem verificado. O interesse dos produtores é que os preços se mantenham muito elevados, durante muito tempo.
De Alberto Simões a 23 de Maio de 2008 às 18:19
De todo. a produção existente excede, por larga escala, as actuais e futuras necessidades dos países. Nem os aumentos de consumo da China e da India são suficientes para explicar o preço do petróleo. E bastam algumas aulas de economia para se perceber que não é de todo do interesse dos produtores que os preços se mantenham muito elevados durante muito tempo. Concordo com parte da sua análise mas discordo totalmente do que lhe serve de fundamento.
De
TAF a 23 de Maio de 2008 às 19:04
"não é de todo do interesse dos produtores que os preços se mantenham muito elevados durante muito tempo"
Se fizer uma análise em que valorize o estado do mundo em geral e os efeitos positivos de uma situação económica favorável para todos, de facto não é vantajoso abusar de uma posição dominante. Além de questões éticas, de solidariedade para com os países subdesenvolvidos, etc., etc. Uma visão macro, considerando tudo o que está em causa e os efeitos directos e indirectos.
Contudo, se estiver apenas a pensar na receita directa da venda do crude, é claro que é bom vendê-lo muito tempo e muito alto. Quem me dera a mim ter uma fonte assim... :-)
Aliás, o facto de não haver garantia de que a produção chegue para a procura futura é que impede a baixa de preços, certo?
De Alberto Simões a 24 de Maio de 2008 às 17:19
Obrigado pela resposta ao meu comentário, TAF. Não era tendo como base questões do plano éticomoral a que me referia quando questionava a sua declaração de que era do interesse dos produtores ter o preço mais elevado o mais tempo possível. Era usando, como explicitamente referi no próprio comentário, estritamente a teoria económica, stricto sensu, a variação de preços.
De
TAF a 24 de Maio de 2008 às 17:33
Caro Alberto Simões, gostava então que me explicasse por que é que vender crude ao valor mais alto possível, de forma duradoura, é mau para os produtores. Pressuposto que me parece consensual: o crude não vai durar sempre, vai esgotar-se antes que a procura termine. O que eu digo é que os produtores terão tendência a limitar a sua produção corrente de modo o manter os preços altos e a fazer durar o mais possível as reservas até que elas esgotem.
«gostava então que me explicasse por que é que vender crude ao valor mais alto possível, de forma duradoura, é mau para os produtores.»
a justificação mais simples para esse facto é que a manter-se tal tendencia, o comprador/consumidor terá tendencia a procurar outras fontes e outros formas de combustivel, o que a prazo acabará efectivamente com o mercado.
é o mesmo que se apssaria se o café unico lá da aldeia vende-se cada chávena de café a 2 euros. Porque o não faz, se o consumidor não tem alternativa?
Porque isso mataria o negocio: as pessoas a prazo optarão por comprar uma máquina expresso caseira, ou tomarão chá.
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 14:52
Gabriel, escrevi eu: "Pressuposto que me parece consensual: o crude não vai durar sempre, vai esgotar-se antes que a procura termine."
Achas mesmo que "o comprador/consumidor terá tendencia a procurar outras fontes e outros formas de combustivel, o que a prazo acabará efectivamente com o mercado"?
Achas que a oferta de petróleo, por este andar, vai acabar por exceder a procura? Afinal já não se vão esgotar as reservas nunca?
O que dizes faria sentido se fosse um recurso inesgotável. Como não é, o raciocínio cai pela base.
«Achas que a oferta de petróleo, por este andar, vai acabar por exceder a procura? »
Claro.
O petroleo serve essencialmente para produzir energia. Existem inumeras outras formas de produção de energia, que apenas não são mais utilizadas (com peso efectivo de mercado) porque razões de custos de produção. Estes podem tornar-se no entanto muito atrativos por duas razões: aumento exponencial do custo de petroleo, tornando as energias alternativas igualmente competitivas, ou, e mais natural, abaixamento substancial dos custos de produção de outras energias.
O aumento de preço do petroleo terá um efeito impulsionador na última hipotese, sobretudo se a expectativo for de manutenção a medio/longo prazo da alta de preços.
a idea de que se consumirá todo o petroleo até ao fim das suas reservas parece-me totalmente irrealista, nem que seja pelo facto de que a partir do momento em que as reservas sejam insuficientes para a procura o preço dispararia para valores incomportáveis.
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 15:19
Ou seja, estamos então de acordo que o preço se vai manter alto e os produtores vão continuar a ter uma excelente fonte de receitas se deixarem os preços altos. Não teriam nenhuma vantagem em baixar os preços porque, se assim fosse, além de receberem menos por barril, as reservas acabavam por se esgotar rapidamente... É isso que eu digo. ;-)
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 14:55
Não sei se me expliquei completamente bem. O que eu digo é que as alternativas ao petróleo não serão nunca suficientes para que a oferta de petróleo exceda a procura. Portanto, os produtores ganharão sempre enquanto mantiverem os preços altos. SE a coisa fosse para os 1000 USD/barril, o caso aí seria provavelmente diferente de tão exagerado. Mas não é "só" com os 100 ou 200 USD que o cenário muda.
«O que eu digo é que as alternativas ao petróleo não serão nunca suficientes para que a oferta de petróleo exceda a procura. »
Nunca? parece-me muito definitivo, ou então o mundo acabará mais cedo do que o esperado.....
«Portanto, os produtores ganharão sempre enquanto mantiverem os preços altos»
também não, os preços apenas se manterão altos enquanto os consumidores entenderem que tal preço equivale ao beneficio que retiram dele. ou seja, quanto menos precisarem de petroleo, mais baixo será o preço..
Como já tentei explicar, a alta de preços levará necessariamente à viabilização de alternativas.
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 15:29
Se quiseres uma resposta menos "definitiva", diria que essa situação acontecerá quando as reservas já forem muito reduzidas. Ou seja, quando claramente o mundo já não possa depender do petróleo porque se assim fosse ele acabaria a muito curto prazo. Nunca antes. ;-)
Caro TAF,
um primeiro problema, é este: «Num funcionamento saudável dos mercados com concorrência real (qualquer que seja o produto ou serviço), há alguma proporcionalidade entre os custos de produção/distribuição, e os preços de venda ao consumidor final»
Não é bem assim.
De uma forma geral o preço é fixado de acordo com a expectativa que o consumidor estará disposto a pagar.
Em segundo, tu não tens actualmente qualquer custo acrescido no consumo/distribuição. Extrair petroleo, refina-lo ou distribui-lo não está mais caro. O que está mais caro é o produto petróleo porque há uma expectativa sobre o mesmo, motivada por várias razões, entre as quais expectativas de forte crescimento de procura, eventual redução da sua produção, factores políticos e de investimento financeiro.
uma segunda questão que tens no teu artigo é que: «nivelar o peso dos impostos dos combustíveis pela norma europeia, para que a actividade económica nacional tenha um contexto mais próximo do europeu;»
não adianta: a média da carga fiscal da gasolina95 na europa é de 60% e em portugal 61% e no gasóleo 51% e em portugal 50%.
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 14:45
"De uma forma geral o preço é fixado de acordo com a expectativa que o consumidor estará disposto a pagar."
Certo. Mas havendo concorrência real isso é função do custo de produção e distribuição. Só quando a concorrência não funciona bem é que o consumidor pode ser "obrigado" a pagar um valor que não tem justificação nesses custos.
"a média da carga fiscal"
Gabriel, nunca houve tanta gente a encher o depósito em Espanha, certo? Isso chega como prova para o meu ponto de que comparativamente os combustíveis em Portugal têm carga fiscal a mais.
TAF
eu usei o teu conceito de «media europeia», não o da vizinhança, o qual pode até configurar uma situação de dumping fiscal.....
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 15:21
Ok, admito que possa não ter usado a melhor terminologia. O meu ponto, de qq modo, é que comparativamente o nosso ISP está alto. Só isso.
«Mas havendo concorrência real isso é função do custo de produção e distribuição.»
não, não é.
O preço é fixado pela percepção de valor do consumidor, pelo que está disposto a pagar.
A cadeia de produção/distribuição ajusta-se a esse valor e não o contrário.
«Só quando a concorrência não funciona bem é que o consumidor pode ser "obrigado" a pagar um valor que não tem justificação nesses custos.
também não é assim.
O consumidor não aceita pagar determinado preço face ao que sejam os custos de produção/distribuição. Mas sim, ele fixa o preço pelo que está disposto a apgar, epal percepção do valor que determiando bem/serviço te´ra apra ele.
É que o consumidor não apenas desconhece os tais custos de produção/distribuição, como os mesmos são fixados precisamente em função do preço fixado pelo consumidor e não o inverso.
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 15:25
"É que o consumidor não apenas desconhece os tais custos de produção/distribuição, como os mesmos são fixados precisamente em função do preço fixado pelo consumidor e não o inverso."
Gabriel, se houvesse essa situação e num mercado desta dimensão, apareceria imediatamente um concorrente com uma fortíssima campanha de marketing a divulgar os custos e a propor um preço mais baixo. Ou apenas até a propor um preço mais baixo, porque tinha condições de produção, distribuição e mercado para o fazer e conquistar clientes. Por isso é que o liberalismo nos mercados, acompanhado de regulação adequada, é bom para o consumidor! Não é precisamente isso que os liberais defendem? Ou já não és liberal? ;-)
De
TAF a 26 de Maio de 2008 às 14:47
"tu não tens actualmente qualquer custo acrescido no consumo/distribuição. Extrair petroleo, refina-lo ou distribui-lo não está mais caro."
Nem eu disse o contrário.
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