Não pode haver sinal de maior desconfiança em relação aos privados do que pô-los a pagar o excesso de despesa que o Estado não consegue diminuir.
Poderemos chegar ao paradigma absurdo de ter finanças públicas saudáveis e não ter economia.
Do que Portugal precisa é de uma programação fiscal que não pode ser vista ano a ano, mas no quadro de uma ou duas legislaturas.
Temos de mostrar, com toda a transparência, qual é a trajectória que esperamos para esse alívio fiscal. E ele está ligado a uma trajectória programada de redução da despesa pública.
Temos que (...) conseguir definir bem qual o papel do Estado para saber, depois, qual o quadro de recursos humanos que precisamos de colocar ao serviço dessas políticas.
Há que procurar distinguir o que deve ser um serviço garantido e produzido pelo Estado daquele que deve ser garantido pelo Estado mas produzido por uma oferta privada.
A chamada rescisão amigável (...) tem um custo mas é um custo que depois é diluído ao longo do período. Esse, sim, é um choque favorável que permite fazer uma convergência de médio e longo prazo para um caminho de sustentabilidade das contas públicas.
Tornar a contratação do lado das empresas mais ágil e mais barata pode ser uma forma de termos mais pessoas a descontar e mais pessoas a fazer descontos para a Segurança Social.
Apesar de tudo, em tempos de crise prefiro que as pessoas tenham uma oportunidade de trabalho mais precário do que não tenham nenhuma.
Defendo uma maior flexibilidade ao nível do ajustamento aos horários laborais, da mobilidade espacial, da reconversão e adaptabilidade no posto de trabalho.
Mais uma entrevista imprescindível para compreender o que espera o PSD e o país se Pedro Passos Coelho ganhar as eleições de 31 de Maio. Excertos:
Qual será a sua grande bandeira se ganhar as directas: económica ou social?
Têm que ser as duas. Se em processos de ajustamentos difíceis, como o que estamos a atravessar, não houver uma preocupação de coesão social, em vez de ganharmos uma década de progresso, ganharemos uma maior conflitualidade e um maior retrocesso. Precisamos de uma aposta bipolar. Reduzir o peso do Estado, apostar no crescimento da economia baseado na oferta privada, empresas e pessoas. Mas, por outro lado, garantir instrumentos de amortecimento social destas mudanças. Não é possível defender, como defendo, maior flexibilidade do mercado laboral e, em simultâneo, não defender uma maior segurança e confiança para as pessoas.
(...)
Quais são as propostas na área fiscal? Ferreira Leite não quer ouvir falar em descer impostos...
Ferreira Leite disse que devia ser proibido falar em baixar a carga fiscal. Penso que deve ser proibido não falar disso. Não podemos abrandar a disciplina das contas públicas, mas não podemos deixar de fazer a reforma estrutural do Estado que permitirá reduzir impostos. Seria um absurdo que daqui a dois anos estivéssemos a chegar ao paradigma do orçamento equilibrado e não tivéssemos empresas ou emprego.
(...)
O que vai fazer com os 700 mil funcionários públicos?
Temos abordado mal o problema dos funcionários públicos. Não sei se temos 100 mil ou 200 mil a mais, porque a primeira coisa a fazer é definir o que queremos que o Estado faça. Há muitos sectores que estão desqualificados, que precisam de reforço. A solução de permitir reformas antecipadas não resolve o problema. Admito que possamos, em diversos sectores, abrir a gestão a privados e dar a opção aos funcionários públicos de ir atrás ou não. Noutras áreas admito que tenham que ser feitas rescisões amigáveis.
Reconhece-se a sua filiação ideológica, mas percebe-se que o PSD das suas facções tradicionais não tem ali lugar. Também não se sabe até que ponto os militantes do partido, os que têm direito a voto, estão despertos para esse tipo de discurso e de ideias. É provável que a partir de agora ele venha a ser visto como o candidato com ideias mais modernas e que dê voz ao eleitorado flutuante do PSD (a classe média das cidades) mais do que às concelhias – que têm sido um factor de atraso estrutural do partido. Se isso basta para ganhar as directas, não se sabe. Mas depois de ter dito o que disse está aberta a porta para a reforma antecipada dos dinossauros, de Santana a Jardim, passando por Menezes e pelo hemiciclo laranja de hoje.
Defendo um Estado forte e digno que não dependa dos privados para exercer a sua função, leia-se negociação das parcerias público-privadas, por exemplo na área da saúde. O primeiro-ministro vem dizer que o Estado não tem competência para fazer negociação com os privados e que portanto não se fazem...
Já estavam lançadas quatro.
Mas houve um recuo. Ora, acho que o Estado deve ter competência para negociar com os privados. E não o pode fazer de uma forma que lance dúvidas sobre a sua independência. Defendo, por isso, o reforço do Estado na sua função reguladora, séria e autónoma face aos privados. Em segundo lugar acho que o Estado precisa de se retirar da economia. Quem cria a riqueza não é o Estado, são as empresas e os indivíduos e nós devemos criar um horizonte muito bem definido de alienação, de retirada do Estado da economia.
Coloca-se como liberal. A liberdade maior tem como consequência maior risco. Acha que os portugueses estão preparados?
Dar mais liberdade implica também dar mais responsabilidade às pessoas. Se queremos que as pessoas sejam mais livres de decidir, temos também de as responsabilizar. Um exemplo. Este Governo fez uma reforma ao nível das pensões que é de saudar. Mas não mexeu no modelo de financiamento. Não apostamos na capitalização. Temos de fazer esse salto qualitativo. Claro que isto envolve risco. Se eu disser que o Estado garantirá sempre no futuro a solução, quer as pessoas tenham poupanças, quer as pessoas não tenham, estou a promover não uma escolha livre, mas uma escolha sem responsabilidade. Acho que esta pedagogia tem de ser feita.
Transponha para a área económica. Aceita maior flexibilidade ao nível do emprego e do despedimento?
Acho indispensável. Temos de caminhar para uma maior flexibilidade das regras laborais. Há que vencer dois mitos. O do despedimento massivo - flexibilizar as regras laborais não significa permitir o despedimento massivo porque as empresas precisam de trabalhadores; a ideia de que as pessoas têm empregos para a vida inteira. Isso não existe, é um anacronismo claro.
O PSD nunca escondeu que defendia uma social-democracia à portuguesa. Definiu-se sempre como reformista, pela Europa e pela economia de mercado. Esta é a história do PSD. O PS demorou muitos anos a perceber que a área pública era essencial para a definição das regras sociais, mas que não podia ser um peso para a sociedade. E o PSD esteve sempre à frente, a puxar para a economia de mercado. Isto é ser de direita ou ser de esquerda?
A esquerda dirá que é ser de direita.
E eu direi que em muitos sentidos isto foi feito contra a estatização mas pela libertação da sociedade civil. Isto é uma ideia de direita? Querem colocar a libertação da sociedade civil à direita? Julgo que não. Conheço muita direita centralista e estatizante e conheço muita esquerda conservadora.
Espero que a seguir à eleição directa e ao congresso haja condições para a união do PSD, mas tenho dito que a união não quer dizer unanimismo. É útil que as pessoas saibam que dentro dos partidos há correntes de pensamento, de estratégia alternativas. Os que perderem não precisam de se envergonhar daquilo que pensam, pelo contrário, devem manter a sua observação. Não exijo uma unanimidade de opiniões nem exigirei o silenciamento de ninguém.
AAN
Filipa Martins
João Espinho
Jorge Fonseca Dias
LR
Paulo Gorjão
Rui A.
TAF
Vasco Campilho
Vítor Palmilha
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